FORTALECER OS MENOS ATIVOS

Todos nós que temos cargos de liderança em âmbito de ala e estaca devemos abrir as portas para as ovelhas perdidas e ficar ao lado para permitir-lhes a entrada.
Presidente Boyd K. Packer
Presidente do Quórum dos Doze Apóstolos

A atividade na Igreja — a oportunidade de servir e prestar testemunho — é um santo remédio.
Cura os espiritualmente enfermos e fortalece os espiritualmente fracos. 
É um ingrediente necessário na redenção das ovelhas perdidas. No entanto, há uma tendência — quase generalizada — de dar oportunidades de crescimento aos que já estão 
sobrecarregados. 
Esse fenômeno, tão visível em nossas estacas e alas, pode manter de fora as ovelhas perdidas.
Quando um mestre familiar leva uma ovelha perdida às reuniões, é apenas o início do processo de reencontro. 
Como podemos aproveitá-la, a fm de ajudá-la a crescer espiritualmente? 

É verdade que não há muitas opções para alguém que esteja com problemas de dignidade. 
E infelizmente parece que mesmo as poucas situações em que podemos usá-las — para proferir orações, dar respostas breves, prestar testemunho — são quase que exclusivamente reservadas aos ativos: a presidência
de estaca, o sumo conselho, o bispado, o patriarca, os líderes das auxiliares. 
De fato, às vezes nos damos ao trabalho de convidar oradores e participantes de fora — em detrimento dos que estão famintos a nosso lado. 
Numa reunião sacramental a que assisti recentemente, uma irmã cujo marido não era ativo na Igreja foi convidada para cantar. 
E ele compareceu. O bispo previu um programa muito especial para a ocasião. 
Seu primeiro anúncio foi: “O irmão X, meu primeiro conselheiro, vai fazer a oração de abertura”. 
O segundo conselheiro proferiu a oração de encerramento.
Que lástima, pensei. Os três membros do bispado, que tanto se empenham para ajudar os espiritualmente enfermos, acabam por pegar o próprio remédio que curaria essas pessoas — a atividade, a participação — e eles mesmos o consomem 
na frente dos necessitados!
Alguns poderão dizer: “Precisamos ter cuidado com os membros fracos em nosso meio. 
É melhor não os chamar para orar ou prestar testemunho, pois pode ser que isso os afugente e intimide e os leve ao afastamento total”. 
Trata-se de um mito! Um mito bastante difundido, mas que não deixa de ser mito! 
Perguntei a centenas de bispos se já viram isso acontecer em sua experiência pessoal. 
Ouvi pouquíssimas respostas afrmativas — na realidade, todos aqueles bispos mencionaram apenas  um ou dois exemplos concretos. 
Portanto, o risco é muito pequeno, ao passo que tais convites podem resultar na reconquista de uma ovelha perdida.
Há vários anos, visitei uma estaca presidida por um homem de eficiência e capacidade incomuns. 
Cada detalhe da conferência da estaca tinha sido meticulosamente programado. 
Como de praxe, ele designara as orações a membros dos círculos exclusivos da presidência da estaca, do sumo conselho, dos bispos e do patriarca da estaca.
Como aqueles irmãos ainda não tinham sido avisados, mudamos as designações, tirando-as dos que mereciam a honra e oferecendo-as aos que tanto — precisavam — da experiência.
O presidente tinha uma agenda detalhada para as sessões gerais e mencionou que deixara vinte minutos em aberto numa delas. 
Propus a participação de alguém que, de outra forma, não teria a oportunidade e que precisava daquela experiência fortalecedora. 
Ele respondeu com a sugestão de deixarmos vários líderes bons e capazes de sobreaviso para possíveis convites de discurso. 
“Vai haver muitos não membros presentes”, disse ele. 
“Estamos acostumados com conferências organizadas e de alto nível. 
Temos membros muito bem preparados na estaca.
Os visitantes vão sair com uma ótima impressão.”
Em outras duas ocasiões no curso de nossa reunião, ele mencionou a ata e sugeriu que os “oradores mais talentosos” da estaca fossem chamados. 
“Por que não reservar esse tempo aos que mais necessitam?” perguntei. 
Foi com certa decepção que ele replicou: “Bem, o senhor é que é a Autoridade Geral”.
No início da manhã de domingo, ele me lembrou que ainda daria tempo de prevenir alguém e assim deixar a melhor impressão possível para os participantes.
A sessão matutina foi aberta pelo presidente com um discurso bem preparado e emocionante. 
Em seguida, foi a vez do segundo conselheiro. Ele estava visivelmente tenso. (…) (Tínhamos combinado anteriormente que ambos os conselheiros discursariam na sessão vespertina. 
Como íamos almoçar na casa dele, achou que ainda teria tempo de rever suas anotações e assim as deixara em casa.)
Por estar sem o discurso escrito, decidiu prestar testemunho e fez um relato inspirador de uma bênção que ministrara durante a semana. 
Um irmão, desenganado pelos médicos, fora poupado da morte pelo poder do sacerdócio. 
Desconheço o teor de suas anotações, mas certamente não se comparava em inspiração ao testemunho que ele prestou.
Uma senhora idosa estava sentada na primeira fleira, de mãos dadas com um homem de aparência abatida. 
Ela parecia deslocada naquela congregação com pessoas bem vestidas, pois usava roupas bastante modestas. 
Parecia estar pronta para discursar na conferência e, ao receber esse privilégio, fez um relato de sua missão. 
Voltara do campo missionário cinquenta e dois anos antes e desde aquela época nunca fora convidada para discursar na Igreja. 
Prestou um testemunho tocante e comovente.
Outras pessoas foram convidadas para fazer uso da palavra e pouco antes do fm da reunião o presidente sugeriu que eu usasse o restante do tempo. 
“Recebeu alguma inspiração?” indaguei. 
Ele disse que o prefeito não lhe saía da mente. (Os eleitores daquela grande cidade tinham elegido um membro da Igreja como prefeito, e ele estava entre os presentes.) 
Quando lhe sugeri então que ouvíssemos uma saudação do prefeito, ele cochichou que o homem não era ativo na Igreja. 
Quando propus que fosse convidado assim mesmo, o presidente resistiu, dizendo categoricamente que ele não era digno de discursar na reunião. 
Diante de minha insistência, porém, ele convidou aquele homem ao púlpito.
O pai do prefeito tinha sido um pioneiro da Igreja na região. Servira como bispo de uma das alas e fora sucedido por um dos filhos — o irmão gêmeo do prefeito, se não me falha a memória. 
O prefeito era a ovelha desgarrada. 
Subiu ao púlpito e falou, para minha surpresa, com amargura e hostilidade. 
Suas palavras iniciais foram algo do tipo: “Nem sei por que me convidaram. 
Não sei por que estou na Igreja hoje. Meu lugar não é aqui. Nunca me identifquei. 
Não concordo com o modo de proceder da Igreja”.
Confesso que comecei a me preocupar, mas em seguida ele fez uma pausa e abaixou os olhos. 
Daí até o fim de seu pronunciamento, não ergueu mais o olhar do púlpito. 
Depois de alguns instantes de hesitação, prosseguiu: “Já que estou aqui, acho que devo dizer-lhes que parei de fumar seis semanas atrás”.
Então, levantando o punho acima da cabeça e rumo à congregação, disse: 
“Se algum de vocês acha que é fácil é porque nunca passou pelo tormento que padeci nas últimas semanas”.
Em seguida, baixou o tom de voz. “Sei que o evangelho é verdadeiro”, testifcou. 
“Sempre soube de sua veracidade. Aprendi isso quando criança, com minha mãe.
Sei que a Igreja não está errada”, admitiu. 
“Eu é que estou, e também sempre soube disso.”
Em seguida, falou talvez em nome de todas as ovelhas perdidas, ao fazer o seguinte apelo: 
“Sei que eu é que estou em falta e quero voltar. Venho tentando voltar, mas vocês não deixam!”
É claro que deixaríamos, mas por algum motivo não tínhamos deixado isso claro para ele. 
Depois da reunião, a congregação se aglomerou — não em nossa volta, mas em volta dele, dizendo: “Bem-vindo ao lar!”
A caminho do aeroporto após a conferência, o presidente da estaca me disse: “Aprendi uma lição hoje”.
Na esperança de antecipar o que ele diria, perguntei: “Se tivéssemos seguido seus planos iniciais, teríamos chamado o pai daquele homem ou talvez o irmão, que é bispo, não é mesmo?”
Ele confrmou com a cabeça e disse: “Qualquer um dos dois, avisados com cinco minutos de antecedência, teria feito um discurso de quinze ou vinte minutos do agrado de todos na congregação. 
Mas nenhuma ovelha perdida teria sido trazida de volta”.
Todos nós, que temos cargos de liderança em âmbito de ala e estaca, devemos abrir as portas para as ovelhas desgarradas e ficar ao lado, para permitir-lhes a entrada. 
Precisamos aprender a não bloquear a entrada. 
É um caminho estreito. 
Às vezes, assumimos a postura desajeitada de tentar empurrá-los portão adentro, quando na verdade nós é que estamos impedindo a passagem. 
Só quando nos imbuirmos do espírito de elevá-los, impulsioná-los a nossa frente e elevá-los acima de nós é que teremos o Espírito que faz brotar o testemunho.
Talvez fosse isso que o Senhor tinha em mente ao dizer: 
“Não necessitam de médico os sãos, mas, sim, os doentes” (Mateus 9:12).
Não estou propondo que rebaixemos os padrões, mas justamente o contrário. 
Mais ovelhas perdidas responderão mais rápido a padrões elevados do que a padrões baixos. 
Há valor terapêutico na disciplina espiritual.
A disciplina é uma forma de amor, uma expressão de amor. 
É algo necessário e transformador na vida das pessoas.
Quando uma criança pequena está brincando perto da rua, ficamos de olho. 
Poucos param para tirar a criança do perigo [e], se necessário, discipliná-la, a menos, é claro, que se trate de nosso filho ou neto. 
Se a amarmos o bastante, nós o faremos. 
Deixar de disciplinar quando isso contribuiria para o crescimento espiritual revela falta de amor e preocupação.
A disciplina espiritual aliada ao amor e confirmada pelo testemunho ajudará a redimir almas. 
Extraído de um discurso proferido numa reunião para líderes do sacerdócio em 19 de fevereiro de 1969. 
O texto integral pode ser lido em Boyd K. Packer, Let Not Your Heart Be Troubled, 1991, pp. 12–21. A ortografa, a pontuação e o uso de iniciais maiúsculas foram atualizados.

0 comentários:

Postar um comentário